Encerrei o último post prometendo falar sobre sobre o paper "Odor Cues During Slow-Wave Sleep Prompt Declarative Memory Consolidation". A ideia aqui é demonstrar que o sono participa da consolidação da memória. A tradução para o título do trabalho pode ser: Pistas olfativas durante o sono de ondas lentas promove consolidação de memória declarativa.
O que o grupo, liderado pelo pesquisador alemão Jan Born, fez foi algo bastante simples, porém muito astuto. Sabendo que cheiros possuem um alto potencial como pistas contextuais, inclusive para memórias visuo-espaciais (como por exempo um jogo da memória, aquele para crianças), eles treinaram sujeitos em um desses jogos de memória e adicionaram e adicionaram um cheiro agradável a cada resposta correta. Mais importante que isso, durante os dois primeiros períodos de sono de ondas lentas os sujeitos foram novamente expostos ao mesmo cheiro. É importante notar que a opção por pistas olfativas foi determinante para o sucesso do experimento, pois em contraste com outros estímulos, é sabido que cheiros podem ser apresentados sem perturbar o sono (mais detalhes sobre isso aqui). O esquema abaixo demonstra o protocolo experimental. Clique para ampliar!
Sendo assim, a hipótese desse trabalho é: Um contexto olfativo apresentado durante o aprendizado da tarefa, é capaz de potencializar a consolidação se apresentado novamente durante o sono. Para ter certeza disso é necessário testar todas as possibilidades. Hora de observar a figura 2.
A figura 2 é um resumo do protocolo experimental utilizado para avaliar todas as hipóteses. O que quer dizer que os pesquisadores avaliaram o efeito da pista olfativa apresentada em diferentes momentos, clique na figura para observar com mais detalhes.
Mas e aí? Qual o grande resultado apresentado?
O que aconteceu foi que os sujeitos que receberam a pista olfativa durante o sono ondas lentas apresentaram melhor desempenho na manhã seguinte. Nenhum efeito do cheiro foi observado em nenhum dos outros 3 experimentos, de modo que quando o cheiro foi apresentado durante sono REM, ou quando o cheiro foi apresentado antes do sono, não há nenhuma alteração na consolidação da memória. A conclusão prévia é simples, alguma coisa acontece durante o sono de ondas lentas que possibilita um reforço na consolidação da memória quando apresentado uma pista olfativa.
Mas essa potencialização da consolidação acontece apenas para memórias declarativas? Para responder essa pergunta os pesquisadores realizaram o mesmo protocolo experimental, no entanto, ao invés de utilizar um teste de memória declarativa, eles realizaram uma tarefa motora (memória não-declárativa). O que aconteceu foi que os sujeitos que dormiram apresentaram melhor desempenho, e essa melhora foi independente da pista olfativa. Aprimorando a conclusão, o que parece é que o sono de ondas lentas é seletivo para consolidação de memórias declarativas.
Para tentar entender o que é que acontece, os pesquisadores forem um pouco mais além, eles utilizaram ressonância magnética funcional para avaliar se o odor era capaz de ativar as mesmas áreas relacionadas com memória declarativa (no caso o hipocampo). O que aconteceu foi que a exposição ao odor durante o sono de ondas lentas aumentou a ativação do hipocampo.
Esse trabalho é uma referência bastante importante para a Teoria do sistema de consolidação. Segundo essa teoria a memória é consolidada durante o sono devido a repetida reativação das áreas envolvidas com o que foi aprendido. Ainda segundo essa teoria, o sono de ondas lentas seria o momento no qual ocorrem essas reativações hipocampais e possibilitaria um diálogo sincronizado entre as áreas relacionadas à memória.
Nos próximos textos falarei sobre a teoria da homeostase sinpáptica, uma outra opção para explicar a participação do sono na consolidação da memória.
Referência:
- Odor Cues During Slow-Wave Sleep Prompt Declartive Memory Consolidation. Björn Rasch et al, Science 315, 1426 (2007); DOI: 10.1126/science.1138581
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