O que chamamos de memória, ou a habilidade para recordar coisas, pessoas, movimentos, lugares, número de telefone, data de nascimento, enfim essa capacidade de lembrar é um processo composto por três etapas diferentes: o aprendizado, a consolidação e a evocação.
O aprendizado pode ser definido por alguns neurocientistas como um processo neural através do qual uma experiência modifica um comportamento. Para o interesse desse texto é importante ter em mente que o aprendizado é uma experiência que pode ocasionar mudanças neuronais. A consolidação pode ser entendida como os processos neuronais (mudanças moleculares ou celulares nos neurônios) que ocorrem após o aprendizado. A evocação é o momento em que lembramos do que aprendemos, ou quando evocamos (sic) alguma memória, o que pode ser uma sequência de passos em uma dança, ou apenas o nome de uma pessoa.
É interessante notar que a evocação depende das mudanças neuronais ocorridas durante os processos de aprendizado e consolidação, algo como, quanto melhor o aprendizado, melhor a consolidação, e melhor a evocação.
Mas e aquela história de que temos vários tipos de memória?
Sim, existe uma classificação para diferentes tipos de memória, a maioria dessas classificações tem o objetivo de facilitar o estudo. Então para facilitar o estudo da memória há sim sistemas de classificação, um sistema que é de acordo com a natureza da memória (o qual explicarei com mais detalhes) e outro que leva em consideração o tempo de duração da memória (que não receberá atenção por aqui - arbitrariedade minha).
Primeiro vou introduzir a figura de uma revisão do professor Robert Stickgold - Sleep-Dependent Memory Consolidation.
Como é possível notar na figura acima, existem dois grandes "grupos" de memória. Memórias declarativas e Memórias não declarativas. A diferença básica entre as duas é que as declarativas são aquelas que podemos declarar que existem, como uma história ou o nome do seu carro. As memórias não-declarativas são aquelas normalmente utilizadas sem a consciência de que estão sendo utilizadas. Ficou confuso, eu sei, mas darei um exemplo que poderá ajudar. Quando caminhamos, não precisamos ter consciência de qual grupo muscular estamos movendo, o mesmo vale para quando andamos de bicicleta. Como vocês podem perceber, cada grande grupo pode ser sub-dividido em grupos menores, porém, para evitar a fadiga, falaremos destes outros grupos em outra oportunidade. O importante aqui é saber que memórias declarativas e memórias não-declarativas possuem diferentes sistemas de consolidação. O que quer dizer que utilizam diferentes estruturas neurais para serem arquivadas. Por que isso é importante? Entenderemos até o final da série! (suspense para manter o leitor, estilo Dan Brow).
E o que o sono tem a ver com tudo isso?
Além da importância do sono para a manutenção do alerta, e da capacidade de concentração, o sono exerce um papel fundamental na consolidação da memória.
Para entender um pouco melhor como isso acontece, é necessário entender como são feitos os estudos que avaliam a participação do sono nos processos mnemônicos.
Mas como avaliar isso? Como saber se o sono tem ou não participação na consolidação da memória?
Uma forma de descobrir isso é comparando o desempenho de pessoas que aprendem uma tarefa e depois do aprendizado vão dormir, com pessoas que ficam acordadas durante esse período. Veja no esquema abaixo que o treino pode ser seguido por um momento de sono, um momento de vigília e ainda um momento de privação de sono. A diferença entre a vigília e a privação de sono é que para ser privado de sono o sujeito deverá ser mantido acordado durante o período no qual deveria estar dormindo, ou seja, durante a noite. O que acontece nesse caso é que os estudos deixam de avaliar o papel do sono e passam a avaliar o que acontece com a memória quando o sujeito é privado de sono.
Utilizando protocolos experimentais bastante semelhante a esse que exemplificado acima existe um grande número de estudos apontando para a participação do sono na memória. Com esse protocolo o que a maioria dos estudos conseguem concluir é: os sujeitos que dormiram apresentam melhor desempenho para o teste tal. Essa informação por si só já é bastante interessante, porém, ainda não resolve a grande pergunta "qual o papel do sono na memória?". Sabemos que quem dorme apresenta melhor desempenho, mas será que apresenta melhor desempenho porque estava em melhores condições quando evocou a memória? Ou será que durante o sono acontece algo que ajuda a consolidação da memória?
Para tentar responder essas duas últimas perguntas um grupo de cientistas alemães modificou um pouco o protocolo "padrão" e adicionou uma pista de cheiro durante o treino e durante o sono. O próximo passo é falar do artigo original "Odor Cues During Slow-Wave sleep Prompt Declarative Memory Consolidation".
Mas esse será o assunto do próximo post.
"Duas postagens em menos de 24h! Sim, sigo andando em frente."
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